sexta-feira, 6 de julho de 2012

"Portas Abertas", de novo, em Santa Teresa





eu:  E aí, Pedrão.
Tá sabendo que amanhã tem um "portas abertas", em Santa?
Pedro:  Fala Edu.
To sabendo, não.
eu:  Apois...
Eu até ia viajar pra Mauá, mas não deu. Tem que preparar mais material pra subir a serra.
Vou ter que ir lá na falcatrua desse portas fechadas pros artistas mais pobres, que expõem nas ruas de Santa Teresa. Ou exponho meus desenhos, ou minhas opiniões a respeito do evento, ligando com a realidade da nossa sociedade, onde o serviço público serve ao privado e o povo que se f...
Pedro:  Amanhã eu vou pra Saquarema. Fds que vem vc vai estar no rio?
eu:  Vou amanhã na porra desse evento.
Não sei se no próximo eu vou estar. Continuo querendo ir pra Mauá. Chei de sodade de Alice Luz e de Brisa do Outono. 
Pedro:  Tu viu o título de patrimônio da humanidade?
eu:  Vi. O que tem de mais?
Pedro:  Hoje descobri o real motivo.
eu:  Aié? E qual é?
Pedro:  Criaram um fundo.
Da prefeitura
eu:  O que esses caras mais criam são fundos - por onde eles entram e saem.
Pedro:  Isso.
eu:  É por onde escoam os dinheiros públicos pros bolsos privados.
Pelos fundos. Pode ser um motivo. Mas tem vários outros, eu penso.
Cê tem informação sobre isso?
Pedro:  Saiu no globo hj:
Pedro:  primeiro eles fizeram cada carioca se sentir um vitorioso pelo título, depois criam o fundo pra escoar o dinheiro.  

eu:  E não se sabe como se "administra" os fundos. Se intui.

Xovê essa merda... 

 Enviado às 08:50 de sexta-feira

Pedro:  O quê isso muda na prática, para um cidadão comum no rio de janeiro?
    eu:  Coitado do cidadão comum...
    eu:  Então acaba a secretaria municipal de patrimônio e entra o instituto rio patrimônio histórico...
E o secretário vira presidente do instituto.
Pedro:  rs
eu:  E sai do controle público.
Aliás, "controle" público (com aspíssimas), que é só na lei, mesmo. Mesmo que não funcione, é sempre um risco.
Cauteloso, sabendo das coisas, o prefeito já deu uma preventiva.
Vai que algum maluco do ministério público ou do tribunal de contas da união resolve criar problemas e dar uma incerta nas contas...
Pedro:  rs
eu:  ,,, num instituto isso encontra mais barreiras que numa secretaria municipal, imagino.
Pedro:  O título é de patrimônio "Cultural" da humanidade.
eu:  É a cultura da competição, do consumo, da obsolescência, da publicidade... a porta enfeitada do inferno.
Pedro:  primeiro a mídia começou a criar a expectativa, olha só o título da matéria:
"Rio ainda tem chance de ser Patrimônio da Humanidade"
eu:  Peraê, cumpade, não comi nada hoje ainda, não posso vomitar.
Pedro:  rs
eu:  Tô na concentração pra encarar o ‘portas’ de amanhã.
Se não me deixarem expor meus desenhos, vou expor minhas opiniões.
Isso eles não podem impedir...
Pedro:  Podem tentar. rs
eu:  Me impedir de falar?
Isso eu ia querer ver.
Pr’eu não falar alto e bom som, talvez até na parte de cima da rua - que serve muito bem de tribuna -, tenho que estar expondo meus desenhos. Aí eu falo mais baixo e com menos gente de cada vez, só com os que pararem pra ver os desenhos. Se me embarreirar, vou explanar geral. Vão ter que me prender ou me abater a tiros. Como vai estar cheio de gente, acho que não fazem isso, não.
O problema é que eu tô sem câmera pra registrar. Perdi o carregador de pilha e não sei se a máquina engasgou ou ficou sem pilha. Com as convencionais não funciona.
Vai estar todo mundo proibido de expor. A guarda municipal já deu o sinal, passaram num carro, domingo, mandando todo mundo que tava expondo sair. Mas não ficaram e, depois de fazer todo mundo recolher as mercadorias, foram embora e todo mundo expôs de novo.
Eles não voltaram.
Pedro:  Vixe!
eu:  Achei que era uma preparação pro evento das 'portas abertas'.
Engraçado que não falaram comigo.
Parece que sabem que iam ter que perder muito tempo comigo, eu não ia sair así, no más. Ou talvez foi porque eu não ocupo o chão, só as paredes.
Pedro:  Todo ano é esse inferno, né?
eu:  É esse evento, organizado por empresa privada. Na visão dos empresários, é preciso "limpar" as ruas e isso significa expulsar os mais pobres de grana, exatamente quem mais precisa trabalhar. Eu, no máximo, tiraria os coloridos, se pressentisse a apreensão. Esses dão trabalho demais pra arriscar. Se é pro sacrifício, prefiro deixar só os p&b. A dor é menor. Mas acho improvável que chegasse nesse ponto.
Pedro:  Eduardo, só abre teu olho que esses caras são covardes pra caramba!
eu:  Ih, rapaz, eu corro muito.
Mas os covardes de verdade não botam a cara, mandam os de baixo, os trabalhadores. E com esses, na maioria das vezes, dá pra tratar.
Os covardes ficam atrás das mesas, telefone na orelha.
 Enviado às 09:08 de sexta-feira
 eu:  Bueno, um que outro vai pra rua, há covardes entre os de baixo também, mas são menos, a maioria é só peão, tem que fazer o que mandam. Quando percebem que eu os respeito, mesmo encarando, que não é pessoal, mas de consciência, e que não fico agressivo com eles, mesmo que apreendam meus desenhos, aí eles suavizam.
Eles tão acostumados com reações agressivas direcionadas a eles. Mas comigo não tem isso, sei que a responsa não é deles.
Até hoje, só perdi minhas coisas em operações, quando não tem conversa, só agressão e apreensão. Mas foram muito poucas vezes...




Espero expor, como todo fim de semana. Eles pretendem impedir - na visão desumana deles, é preciso limpar a rua dos expositores que não pagam a empresa pelo evento, como os comerciantes e os artistas mais abastados do bairro. Não percebem a hipocrisia, não se tocam da covardia, não se importam com prejudicar os mais pobres de grana. É uma exposição da pior pobreza, a de espírito, comum entre endinheirados - não é preconceito, é pós-conceito, diante dessa prática tão comum. As empresas de bebidas e refrigerantes, as empresas de revenda nos estádios, mais o poder dito público, proibiram os isopores - recurso dos mais pobres para arrumar um dinheiro ou tomar seu refri ou cerva mais baratos - de funcionar nas calçadas e logradouros, num raio de quilômetros dos estádios. As evidências são óbvias, apesar de qualquer argumentação, e há uma profusão delas, que tente explicar com outras razões. Muitas verdades pequenas escondendo a grande mentira - o objetivo é o lucro máximo e nada mais. Pra isso o aparato público é posto a perseguir os pobres que tentam trabalhar apesar do desemprego - aliás, por causa dele.

Aos que dizem que não pagamos impostos e por isso é justo que sejamos impedidos de expor, respondo que pago mais impostos, proporcionalmente, que qualquer um que afirme essa mentira. Mais da metade do que ganho sai em impostos, pois o sistema tributário se baseia no consumo, não na renda, nem na propriedade, que esses têm é isenção de todo jeito. Além do mais, expondo em paredes externas, eu teria que pagar que tipo de imposto? Predial? Não faço comércio, faço arte, e pago impostos sobre tudo o que uso, papel, tintas, ferramentas, transportes, tudo, tudo. 

O direito ao trabalho me autoriza, já que o Estado não garante o que manda sua constituição federal, alimento, moradia, ensino de qualidade, trabalho, saúde, etc, etc. Que moral tem esse Estado criminoso pra me impedir de trabalhar, me atacar com o aparato de segurança pública como se eu fosse um perigo pra coletividade, me tomar o produto do meu trabalho e, se encontrar resistência, me agredir e prender? Moral não tem, mas tem armas e soldados treinados pra atacar quem não pode se defender.

Os guardas dizem pra ir na prefeitura tirar uma autorização. Eu respondo que há mais de trinta anos vivo do que faço, expondo nas ruas e praças, e jamais um poder público me autorizou, exceção feita a essas feirinhas que as prefeituras estragam com sua ingerência e que junta um monte de aposentados (as) que não vive exclusivamente do que expõe e pode ficar comendo mosca sem vender nada, fazendo terapia ocupacional. Essas feiras não vendem. Acho que é por isso que autorizam. Onde se vende, não pode. Além do mais, nas prefeituras eles ficam te mandando de um lugar pra outro, querem te qualificar num dos padrões definidos por eles, que nunca satisfazem, pelo desconhecimento da nossa realidade, e te fazem esperar e esperar até que você desiste, depois de perder um tempão que não podia ser perdido. Se fosse esperar por esse poder corrompido, morreria de fome com minha família, depois de perder casa e tudo o mais.

Amanhã, então, Santa Teresa de "portas abertas"... Espero poder expor. Caso contrário, denunciar o esquema, a covardia, fazer as ligações com a nossa realidade social, política e econômica também será divertido, embora precise vender desenhos. Pra prevenir, hoje vou na ABI (Associação Brasileira de Imprensa), às 18:30, numa plenária da candidatura do Freixo e do Yuka à prefeitura do Rio que pretende discutir alternativas pro governo municipal. Vou pra expor os desenhos e textos. É uma rapaziada mais pensante, mais sensível que a maioria, mais esclarecida e bem intencionada que outras coletividades da política, ou seja, ali meu trabalho se encaixa bem, tem boa receptividade. E eu me previno pra gastar meu sábado sem vender, só falando com as pessoas, se for preciso. Espero que me deixem expor. Nem que seja pra evitar o incômodo da minha falação bem no centro do bairro e do evento - eles já me conhecem, que eu sei... 

2 comentários:

  1. Caro amigo, espero que tenha conseguido expor seus trabalhos. Já li tudo isso que vocè relata nesse post, não me recordo se em seu livro ou em outro post. Achava que isso não iria mais se repetir. Autorização ? Absurdo. E a liberdade que um artista tem de expor suas obras ? Abs.

    ResponderExcluir
  2. A rua é pública, meu deus! Não pertence a ninguém, mas ao público. É a esfera pública, onde cidadãos reúnem-se, na ação e no discurso, para construir a vida coletiva! Essa empresa que vá tomar no fiofó.

    ResponderExcluir

observar e absorver

Aqui procuramos causar reflexão.