terça-feira, 9 de agosto de 2011

É melhor em paz



         Quando alguém declara não acreditar em alguma história que conto, em vez de ofendido eu me sinto elogiado. Houve quem não acreditasse que eu fazia os brochinhos, em relevo no metal, com fechos em arame trabalhado com alicate e soldados com maçarico. Um camarada chegou a dizer que sabia onde eu comprava, em São Paulo. Eu explicava pra algumas pessoas do mesmo grupo como eu fazia a corrosão, a solda, e tal. O cara ainda disse que havia estado lá no dia anterior. Mentindo descaradamente, convicto de que era impossível eu ter feito os broches. Eu ri, a explicação terminara.“Vou tomar como um elogio” eu disse a ele, “cê tá achando meu trabalho tão bom que não é possível eu fazer à mão, tem que ter sido feito pela indústria, né não?” No silêncio que se fez, segui o caminho. O descrédito, quando não é uma provocação pura e simples, no fundo, é um elogio. Tão incrível que não pode ser verdade. Por quê se aborrecer?
         É direito de cada um acreditar ou duvidar do que quer que seja. Em caso de dúvida pode ficar como mentira, não é agradável, mas possível e respeitável, não tem problema. Arte é mentira, olhando pelo lado da criação se vê um conto, uma ficção. E gracias.
         Sinto uma grande gratidão pela vida, pelas possibilidades de ter vivido tantas histórias, tantas situações tão diferentes, tendo a pouca ou a falta de grana como o único ponto comum. Sei muito bem o que vivi e, se hoje tenho histórias pra contar, ser considerado mentiroso ou ficcionista por alguns não tem muita importância. Nestas histórias, há qualquer coisa de serviço. Vivências trazem ensinamentos, informações, advertências, orientações; o proveito depende de cada um, de fatores externos e internos. As histórias caminham pelo mundo procurando os que precisam dela ou que podem lhe dar proveito. Vi muitas vidas à minha volta, milhares de histórias de todos os tipos. A diferença é que tive o privilégio de estudar em boas escolas. Aprendi a me expressar, tive acesso à instrução como deveria ser para todos. Posso escrever o que vi e vivi. No meu pensar, qualquer privilégio gera uma obrigação moral com a população sabotada, roubada em seus direitos básicos – necessários a uma vida justa. Privilégios são vistos como superioridade social pela maioria, mas são, pra mim, dívidas morais com a coletividade. Não cobro de ninguém além de mim mesmo, não nasci pra cobrador. Cada um sabe de si e carrega sua própria consciência, sua própria história, seus plantios e suas colheitas. Não trato das escolhas feitas, mas das escolhas possíveis. E das impossíveis.
         Trabalhar com idéias, com reflexões e questionamentos é como semear a terra. Gosto de trabalhar com terras férteis, onde as sementes brotam. Cada semente tem suas circunstâncias ideais, suas indicações e contra-indicações, seus momentos e condições para crescer e frutificar. Cada terra tem suas características, seus momentos, na hora de plantar é preciso escolher a semente propícia às condições, para brotar, crescer e dar frutos. Não gosto de perder tempo e energia com terras áridas, onde se encontra mais conflitos, aborrecimentos e desgastes sem nenhum proveito, com freqüentes e evidentes prejuízos. Não se plantam sementes nas pedras ou na aridez.
         O trabalho de esclarecimento, conscientização e, sobretudo, sensibilização acontece melhor com calma, harmonia e concordância de propósitos. E a vida flui melhor, mais em paz. Discordâncias não precisam se tornar discórdias.   

3 comentários:

  1. Trombei com uma frase esse ano, não sei de quem é mas gostei muito: "Nunca dê explicações. Os inimigos não acreditarão, e os amigos não precisam."

    Um grande abraço!

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